sábado, 9 de abril de 2016

A Esplanada

Sexta-feira ao fim do dia, João e José amigos de longa data encontravam-se numa esplanada beira-rio. Todas as sextas feiras, já nem era necessário combinar. João saía às 18H00 e ia logo sentar-se de fronte para o rio enquanto José que sairía daqui por uma hora, não aparecia. Eram bedidas cervejas enquanto amigos conversavam sobre tudo, nada e a semana passada. Ambos usavam este tempo para relaxar e limpar da cabeça os dias perdidos. Foi num destes fins de tarde, interrompendo um período de silêncio e contemplação que, sem avisar, João notou:

- Fodasse! É estranho não é?
- O quê? -interrompeu José
- Aquela sensação parva que dá de repente. Que estavas melhor noutro lugar.
- Sozinho numa ilha paradisíaca com duas boazonas! Hehe! Aí é que eu queria estar!
- Não pá! Noutro lugar, caralho! Não aqui! Noutro lado qualquer, fora daqui.
- Hãn?!
- Sim, pá! Não te apetece às vezes não estar cá? Desaparecer. Dizer: "Epá isto foi bom; foi muito giro estar cá e tal mas agora vou embora. Xau Maria, xau maltinha. Dou por concluida a minha presença. Fui."
- Emigrares?
- Sim... ... ... da vida.
- ...
- Epá! O estranho é quando esta ideia te vem à cabeça nas alturas mais improváveis... Olha, nem vás mais longe: no outro dia, no aniversário do Luís. Estavamos lá todos satisfeitos a jantar, a recordar histórias, a rir... Lembras-te?
- Sim.
- De repente dou comigo a pensar em como é que me posso ir embora; sabes? e o mais assustador é que não sei quanto tempo é que estive ausente a planear isso.
- ...
- Estavamos ali todos. O grupo reunido: mulheres, namoradas, filhos de uns e de outros. Tudo satisfeito. E deu-me para olhar em redor e pôr-me a pensar que pronto, já chegava para mim e agora aqui como é que posso acabar?
- ...
- É parvo pensar num coisa dessas num sítio assim. É estranho.
- ...
- ...

João e José continuaram a encontrar-se todas as sextas-feiras às mesmas horas naquela esplanada. Esta conversa nunca mais se repetiu e nenhum deles voltou a abordar o assunto.